Graças a um conjunto coordenado de medidas e programas ambientais, Chapecó conseguiu controlar um grave problema ambiental. A produção de suínos em grande escala e concentrada em pequenas propriedades acabou causando a contaminação de córregos e rios por dejetos dos animais, situação que chegou ao ápice dez anos atrás. Os esforços para resolver o problema uniram prefeitura, governo de Santa Catarina, órgãos ambientais, Ministério Público Estadual e Polícia Militar Ambiental.

A pressão dos países importadores sobre os frigoríficos também foi importante. Como um dos maiores polos de produção de proteína animal do mundo, a região de Chapecó é alvo de frequentes missões internacionais que vêm inspecionar seus métodos. A região exporta carnes e derivados de suínos e aves e derivados de leite para cerca de 150 países. “Temos de cumprir exigências internacionais e ter sustentabilidade para nos mantermos na atividade”, diz Ricardo Lunardi, secretário de coordenação de governo da prefeitura de Chapecó. “Foi um desafio muito grande cumprir todas essas exigências que a agroindústria faz aos produtores, muita pressão para atingirmos metas de qualidade.”

Segundo Neivor Canton, vice-presidente da Coopercentral Aurora Alimentos, a reação ao problema de contaminação foi rápida. “O Ministério Público fez um trabalho ótimo, fez termos de ajuste de conduta com os produtores e colocou a polícia ambiental para verificar e punir o não cumprimento da legislação ambiental”, diz Canton. Com a implantação das melhores práticas de destinação de dejetos e do licenciamento ambiental obrigatório para granjas e criadouros de suínos, que prevê uma série de outras exigências, a região, diz ele, foi passada a limpo. “Hoje não há nenhuma propriedade de criação de suínos sem ser licenciada. A Aurora não abate um suíno que não seja oriundo de propriedade ambientalmente correta”, afirma.

São os frigoríficos que fornecem os leitões para serem criados pelos suinocultores. “Hoje falo com clareza que uma instalação de animais que não tenha licença não recebe os animais dos frigoríficos, que são solidários na culpa, sofrem sanções do Estado e dos importadores”, explica o biólogo Bernardo Beirith, analista técnico de proteção ambiental da Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (Fatma) em Chapecó.

O problema com os dejetos de porcos é que, ao contrário dos de aves, é úmido e volumoso, não pode ser usado diretamente na adubação de plantações. Precisam ser armazenados em condições que impeçam sua infiltração no solo e transbordamento para os rios e córregos. Só depois de secos é que podem ser transportados e utilizados como adubo, ainda assim, em quantidades controladas para não saturar o solo. De acordo com Beirith, para não contaminar o aquífero (água subterrânea) as esterqueiras (fossas abertas no chão para depósito dos dejetos) precisam ser impermeabilizadas com PVC. Depois de 120 dias, sem absorver oxigênio da água, esse material pode ser utilizado como adubo. “Algum vizinho próximo pode receber esse adubo, por meio de um contrato de cessão. Com a agregação de serragem, para se tornar seco, ele também pode ser transportado para áreas mais distantes, até para outros estados”, diz Beirith.

Segundo o secretário Lunardi, para conseguir aprovação dos órgãos ambientais, os suinocultores estabelecidos na área da bacia hidrográfica do Lajeado São José, principal fonte de captação de água potável para abastecimento da cidade, têm de apresentar um projeto bastante detalhado do empreendimento, especificando localização, declividade do solo, respeito a áreas de preservação permanente (APP) e reserva legal, entre outras providências. Precisam também retirar os dejetos com caminhão-tanque, ou por um sistema de bombeamento, e depositá-los em uma área longe da bacia.

Tais exigências desestimularam a criação desses animais na área da bacia de captação de água. A operação tornou-se onerosa, já que os produtores têm de transportar diariamente esse material, por pelo menos dez quilômetros. A expansão da área urbana e consequente valorização dos terrenos também afastou a atividade para áreas mais distantes. O número de suinocultores nas proximidades da cidade caiu de 17, em 2007, para apenas três hoje, segundo Terezinha Julieta Lima, especialista ambiental e coordenadora do programa Água Boa, da Secretaria de Agricultura e Serviços Rurais do município, que visa preservar áreas de nascentes do Lajeado São José e sua mata ciliar. Nas áreas mais distantes, as propriedades não podem ultrapassar o limite de saturação do solo. “Elas têm que apresentar um estudo assinado por um técnico e não podem ultrapassar a capacidade de absorção do solo”, diz Lunardi.

O programa Água Boa, iniciado em 2007, abrange 130 propriedades em cerca de 12 mil hectares. Conta hoje com recursos da Foz do Chapecó Energia, Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan) e Brasil Foods, usuária da bacia hidrográfica. O programa se estende a duas outras bacias contíguas, do Lajeado Retiro e do Lajeado Tigre, que abastecem o município de Guatambu e, nos momentos críticos de estiagem, complementam o abastecimento de Chapecó. O programa também inclui a distribuição de mudas de árvores nativas a essas propriedades, para serem plantadas nas áreas de mananciais e, com isso, recompor a mata ciliar ao longo dos córregos e rios. Com os recursos do programa, a prefeitura também fornece mourões, arame e outros materiais para cercar e isolar as áreas de preservação permanente e impedir o acesso direto do gado de leite à água. Os produtores também recebem tubulações para levar a água até os tanques destinados ao gado.

Fonte: Valor Econômico