MAPA se une a produtores e indústria para blindar a suinocultura brasileira contra o PEDv.

Foto: ASCOM/CIDASC

A Diarreia Epidêmica dos Suínos (PED) continua a assombrar a suinocultura mundial. Seu epicentro segue sendo os Estados Unidos, mas seu rápido avanço pelo mundo tem colocado todos os países produtores de carne suína em estado de alerta.

Passado mais de um ano de seu registro em território norte-americano, a doença continua a causar severos estragos à suinocultura de lá. Apesar de todos os esforços que vêm sendo feitos pelas autoridades do país, uma solução para conter a doença parece estar longe de ser encontrada. Ao menos no curto prazo.

A PED já atinge 29, dos 50 estados norte-americanos, sendo responsável pela morte de mais de 7 milhões de suínos. Cerca de 50 novos casos de PED são diagnosticados a cada semana nos Estados Unidos, revelam dados dos laboratórios oficiais do país. Como os sinais clínicos da doença são de fácil reconhecimento, estima-se que esse número possa ser ainda maior, já que muitas ocorrências podem não estar sendo diagnosticadas em laboratório.

Um fato novo, ocorrido no final de maio, reafirmou o poder do PEDv ao mesmo tempo em que lançou ainda mais dúvidas sobre as estratégias usadas para sua contenção. Uma granja do estado de Indiana tornou-se a primeira a confirmar publicamente um segundo surto da doença.

Leitões nascidos de porcas infectadas pelo vírus em maio de 2013, apresentaram sintomas da enfermidade. Apesar de a taxa de mortalidade ser menor (cerca de 30% em comparação ao índice de quase 100% de mortalidade entre leitões durante o primeiro surto), ainda assim a reinfecção dos animais surpreendeu os médicos veterinários envolvidos no controle da doença no país. Ou seja, o surto da doença nos Estados Unidos tem se mostrado mais difícil de ser contido do que os cientistas pensavam.

A peste avança pelo mundo

Engana-se, porém, quem pensa que o problema sanitário esteja circunscrito aos Estados Unidos. Pelo contrário, a peste avança pelo mundo a passos rápidos. E é justamente aí que reside o perigo. A PED já se transformou na doença entérica de maior importância já reportada na suinocultura mundial. Além dos Estados Unidos, há registros graves da doença em vários e diferentes países como Canadá, México, República Dominicana, Japão, Coreia do Sul, China, Filipinas, Tailândia, Alemanha, Espanha, Itália, República Tcheca, Hungria, Colômbia e Peru.
O complicador é que a comunidade científica ainda não conhece por completo sua dinâmica de transmissão. Nem como o vírus da doença vem “caminhando” de país para país. A PED continua a desafiar a suinocultura mundial. A doença está por perto e ronda qualquer país produtor de suínos.

Diante dessa escalada, os poucos países ainda livres da PED vêm reforçando seus cuidados sanitários para evitar a entrada da doença em seus domínios. Quarto maior produtor e exportador mundial de suínos, o Brasil vem trabalhando para impedir o ingresso do vírus da PED por aqui. Juntos, os setores público e privado se organizam para blindar a suinocultura brasileira.

“Desde o ano passado o setor suinícola e as autoridades brasileiras vêm se articulando para adotar medidas para evitar a introdução do PEDv no Brasil. Em março fizemos uma reunião em Brasília [DF] e junto com o Ministério da Agricultura, produtores, indústria e laboratórios, instituímos um Comitê de Trabalho e estamos elaborando um Plano de Contingência contra a PED”, explica Janice Zanella, pesquisadora da Embrapa Suínos e Aves e coordenadora do Comitê de Trabalho.

Segundo a pesquisadora, em paralelo, o setor vem agindo junto aos suinocultores para a divulgação de recomendações básicas – como o reforço das medidas de biossegurança, restrição de visitas e monitoramento do tráfego de veículos nas granjas, adoção de normas para a importação de insumos etc.-, que podem ser aplicadas no dia-a-dia das propriedades e que são essenciais para prevenir a entrada da PED no País.

“O mais importante é que representantes de diferentes segmentos da suinocultura brasileira estão envolvidos. O setor já entendeu que manter o País livre da PED é uma responsabilidade de todos, e não apenas do governo, da indústria ou dos produtores. Várias medidas vêm sendo executadas para este fim”, afirma Zanella.

Operações de risco: animais vivos e ingredientes para ração

De acordo com Nélson Mores, pesquisador da Embrapa Suínos e Aves, uma das principais “portas de entrada” para o PEDv no Brasil é a importação de animais. Segundo o especialista, a maioria das enfermidades que ingressa no País o faz através da entrada de animais vivos. “A primeira coisa a se fazer é redobrar os cuidados com a importação de animais”, adverte Mores.

De olho nessa fragilidade, o Ministério da Agricultura adotou algumas medidas para reforçar os cuidados com esse tipo de operação. Além de reformar as instalações para suínos da Estação Quarentenária na Ilha de Cananeia (EQC), o Mapa estabeleceu novas normas para a importação de animais vivos e material genético. Desde março, todas as importações de suínos vivos são autorizadas exclusivamente pelo Departamento de Saúde Animal, da Secretaria de Defesa Animal do Mapa (DSA/SDA/Mapa), que analisa, caso a caso, cada pedido. O mesmo acontece com a importação de sêmen.

Além disso, os animais importados devem ser originados de estabelecimentos certificados pelo serviço veterinário do país exportador da ausência da doença, e cumprir quarentena na origem e na EQC por 30 dias antes de serem levados para as granjas comerciais brasileiras.

Embora considere as medidas efetivas para evitar a entrada da PED no Brasil, Mores defende a suspensão da importação de suínos até que o país desenvolva todas as ferramentas para diagnóstico e monitoria do PEDV por aqui. “Numa quarentena, além do diagnóstico do agente etiológico, é necessário fazer a monitoria do anticorpo. E até o Brasil se equipar com tudo isso, talvez fosse mais conveniente não permitir a entrada de animais vivos por um período”, argumenta o pesquisador.

O Brasil conta atualmente laboratórios credenciados para fazer diagnóstico no caso de suspeita de introdução do vírus no País. São testes de PCR em tempo real, sistema desenvolvido pela própria Embrapa Suínos e Aves. “O PCR é um teste rápido, sensível, confiável, mas é necessário também desenvolver testes sorológicos. Alguns já estão sendo implantados, como a imunoistoquímica, e isso é importante. Em diagnóstico laboratorial é fundamental que existam testes confirmatórios”, corrobora a pesquisadora Janice Zanella.

Outro vetor para a entrada do PEDv no Brasil são os ingredientes para alimentação dos suínos. Atento a essa vulnerabilidade o Mapa intensificou os cuidados e adotou procedimentos técnicos para a importação de insumos para o arraçoamento dos animais. As importações de plasma suíno para ração animal agora só podem ser autorizadas pela SDA/Mapa. Para tanto, precisam ter origem de estabelecimentos registrados pelo serviço veterinário do país exportador, com certificação sanitária oficial quanto aos requisitos estabelecidos pelas autoridades brasileiras para importação.

Educação sanitária: foco na prevenção

O setor suinícola brasileiro também vem intensificando os cuidados com a sanidade no dia-a-dia da produção. O Comitê formado pelo Mapa, Embrapa, indústria, produtores e laboratórios, vem desenvolvendo um forte trabalho de educação sanitária junto aos suinocultores brasileiros. “Temos trabalhado muito com educação sanitária. Estamos participando de muitos seminários, workshops, reuniões técnicas com os produtores e as indústrias, informando-os sobre as principais características da doença, enfatizando a necessidade de promover melhorias na biossegurança das granjas”, conta Zanella.

Uma das principais medidas preconizadas pelos especialistas da Embrapa é a proibição de vistas nas propriedades, tanto dos técnicos brasileiros que visitam granjas em países infectados quanto de técnicos estrangeiros que vêm ao Brasil. “Essa é uma medida muito importante para evitar a entrada da doença no Brasil. Não se pode deixar mais deixar pessoas estranhas entrarem nas granjas”, adverte Mores. Segundo o especialista, mesmo os técnicos que habitualmente passam pelas granjas devem respeitar vazio sanitário de 15 e 20 dias.

A pesquisadora Janice Zanella ressalta também a necessidade de monitorar o trânsito de veículos nas propriedades e o ingresso de objetos ou equipamentos que possam ter passado por outras granjas. “Carros e caminhões são vetores de importantes e precisam ser monitorados. É preciso lavá-los e desinfetá-los adequadamente, o que não é tarefa fácil”, explica Zanella. “O mesmo cuidado se deve ter com equipamentos e objetos que eventualmente entram nas granjas”.

Outro cuidado fundamental, alerta a pesquisadora da Embrapa Suínos e Aves, é com a compra de insumos importados, sobretudo os destinados à alimentação dos animais. E, igualmente importante, é que o produtor, na eventual ocorrência de quaisquer sinais clínicos que indiquem a contaminação por PEDV, avise o serviço sanitário oficial imediatamente, para que as medidas para evitar a disseminação do vírus sejam tomadas de maneira ágil e rápida.

Todo cuidado é pouco

Tanto Janice Zanella quanto Nelson Mores, acreditam que o Brasil vem fazendo a “lição de casa” para impedir o ingresso do vírus no País. “Os setores público e privado vêm trabalhando em sinergia para evitar a entrada da PED no Brasil. A reforma na quarentena de Cananeia, as novas normas para importação de animais, o trabalho de educação sanitária que vem sendo feito, as recomendações para o fortalecimento das medidas de biossegurança nas propriedades etc., são atividades que ajudam a minimizar as vulnerabilidades da suinocultura brasileira”, opina Mores.

Usando a mesma linha de argumentação, Janice Zanella, acredita que o Brasil está no caminho certo para prevenir a entrada da doença por aqui, embora faça questão de ressaltar que no campo sanitário nenhum país está livre do risco da emersão de uma doença como a PED. “Há um trabalho conjunto do setor para que a doença não chegue até aqui. Desde que formamos o Comitê tenho sentido uma postura proativa dos representantes dos diferentes elos da cadeia suinícola.

As informações estão circulando, todos estão engajados e conscientes dos riscos que uma eventual entrada da PED imporia à suinocultura brasileira”, afirma a pesquisadora. “Temos que olhar esse desafio sanitário também como uma oportunidade. Uma oportunidade para aprimorar nossa biossegurança, para implantar metodologias de diagnóstico que ainda não estão disponíveis em nosso País, enfim, para demostrar ao mundo nossa capacidade de organização”, conclui Zanella.

Fonte: Esta matéria foi originalmente publicada na revista Suinocultura Industrial; edição 258 – nº 03/2014